Imigrantes portugueses sem documentos receiam nova era Trump
O regresso à Casa Branca de Donald Trump, prometendo deportações em massa de imigrantes sem documentos nos Estados Unidos está a assustar portugueses que deixaram expirar os vistos na Califórnia.
“A volta deste Presidente está a mexer com o estado psicológico não só meu, mas de muita gente que está na mesma situação que eu como imigrante”, disse à Lusa o português Emanuel Carvalho (nome fictício), que está em Los Angeles há nove anos e ficou em situação ilegal quando o visto expirou.
“As promessas que este novo governo fez vão afetar diretamente todos os imigrantes, incluindo eu. Não vou mentir, não consigo dormir desde que este Presidente ganhou”, adiantou o português.
Carvalho, que rumou aos Estados Unidos “em busca de uma estabilidade maior” para si e para os filhos, disse que a vida de imigrante sem documentação é muito difícil e cheia de altos e baixos. Agora, receia que a situação piore de forma considerável.
“Estou com muito receio do futuro, não sei o que vai acontecer. Tenho pessoas que dependem de mim também”, referiu. O imigrante montou uma empresa e paga impostos, mas não consegue modificar o seu estatuto depois de o visto expirar. “Os próximos quatro anos vão ser um inferno para mim”.
Também Maria do Carmo (nome fictício) está receosa do que vai acontecer com a nova administração Trump. Tem uma família mista em termos legais, com documentos e sem documentos, e pode ser alvo da separação familiar que caracterizou a anterior administração republicana.
“A minha filha acabou de entregar os seus papéis para receber a autorização de residência e está com medo”, disse à Lusa. “Também eu e o meu marido, porque não estamos legais ainda”.
Maria do Carmo explicou que muitos dos seus amigos votaram em Donald Trump e isso gerou discussões durante a campanha, devido às posições anti-imigração do agora Presidente-eleito.
“Eu digo aos meus amigos se acham bem votar num corrupto”, afirmou. “Um homem que quer deportar muita gente e muitos deles são imigrantes ou filhos de imigrantes”, indicou. “Mas quem acredita diz que ele vai mudar a América e o mundo e os preços da gasolina vão baixar”.
A família portuguesa, que estabeleceu posições sólidas na sua comunidade na Califórnia, não tem outra opção senão “viver dia a dia e passar despercebidos”, afirmou.
Carmo lamentou a retórica e disse que, se as deportações em massa acontecerem, duvida que os norte-americanos queiram trabalhar “onde muitos imigrantes trabalham”.
Para Emanuel Carvalho, que se diz “sem uma esperança” neste momento, o elemento positivo é estar na Califórnia, um estado com muitos imigrantes e cuja liderança já se comprometeu a dificultar os planos de Trump.
“Agradeço muito estar neste estado da Califórnia onde pude arranjar um trabalho, alugar uma casa, ajudar os meus filhos e a minha família”, afirmou. Ainda assim, aponta os obstáculos.
“É difícil estar aqui devido à falta de documentação, porque nos privam de muita coisa. Uma pessoa não consegue ter cartão de crédito, tem de ter sempre dinheiro para pagar tudo em débito, e é difícil arranjar trabalhos”.
O presidente-eleito Donald Trump nomeou Tom Homan para liderar a nova política relativa à fronteira e planear as deportações em massa. Homan foi o arquiteto da estratégia da anterior administração de retirar bebés e crianças aos migrantes em busca de asilo e colocá-los em estruturas que foram comparadas a jaulas, de forma a desencorajar famílias a tentar entrar nos Estados Unidos.
A política causou muita controvérsia e foi rescindida a 20 de junho de 2018, sendo que ainda há cerca de 1.400 crianças que não conseguiram ser devolvidas aos pais seis anos depois. São dados de uma ‘task force’ criada por Joe Biden para reunificar as 5.000 crianças retiradas aos pais que pediam asilo legalmente.
Várias organizações de defesa de imigrantes em Los Angeles já se pronunciaram sobre o resultado das eleições e prometeram reforçar o trabalho para proteger os mais vulneráveis.
Angélica Salas, diretora executiva da CHIRLA – Coalition for Humane Immigrant Rights, partilhou um vídeo no qual apelou a que as pessoas ajudem a organização com contribuições e voluntariado, devido à ameaça do regresso de Trump.
“O que isto significa para organizações como a CHIRLA é que agora temos uma agenda de deportações em massa e separação de famílias e um ataque às comunidades imigrantes”, afirmou. “Levamo-lo muito a sério”.
Salas disse que os defensores dos imigrantes são resilientes e vão tomar uma posição forte. “Vamos defender indivíduos que só procuram proteção neste país, que trabalham diariamente para garantir que não só as suas famílias conseguem avançar, mas que todo este país se move em frente”.
Também a diretora da Esperanza Immigrant Rights, Kimberley Plotnik, disse estar cheia de “pavor e tristeza” com a eleição.
“As políticas anti-imigrantes defendidas pela campanha de Trump, e as que foram executadas durante a sua anterior administração, eram e continuam a ser devastadoras, desumanas e injustas”, considerou a responsável do programa, organizado por uma coligação de associações católicas em Los Angeles.
“Na Esperanza, assistimos ao impacto destas políticas em primeira mão e muitos de vocês, os nossos apoiantes dedicados, também viram os seus malefícios”.
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Lusa/Fim